Álvaro Miranda fala sobre a base do Vasco e trabalho com jovens jogadores
Sexta-feira, 25/08/2017 - 18:14
Campeão carioca sub-20 com total justiça (venceu os dois turnos e a final, o Vasco hoje tem um dos melhores elencos de juniores do Brasil, e muito disso se deve ao fato de vários jogadores terem tido experiências nos profissionais, contra um elenco bem menos rodado do Flamengo. Isso, de fato, é verdade, mas não tira, de maneira nenhuma, o mérito da conquista. Até porque, se mal administrada, a prática tem o efeito contrário ao pretendido.
No caso do Vasco, não teve. Andrey, Alan Cardoso e Mateus Vital retornaram aos juniores após oito meses nos profissionais e encorparam um time que parecia desacreditado. Havia sido eliminado pelo São Carlos na Copa São Paulo, e perdido jogos importantes no Estadual contra Volta Redonda e Madureira. Chegou a ter a vaga para a semifinal do primeiro turno colocada em risco. Mas a chegada desses três, que vieram sem fazer biquinho por voltar aos juniores, foi fundamental para o sucesso do time, que se tornou uma das melhores equipes sub-20 do país.
O processo, no entanto, não surgiu do nada. Foi e é construído diariamente. E um dia ruim da equipe foi chave para que as coisas melhorassem.
- No ano passado, tivemos uma derrota por 5 a 0 para o Fluminense nas Laranjeiras e eu conversei com alguns jogadores que desciam dos profissionais e não foram bem ali. É um trabalho de formiguinha, diário, e precisamos sempre estar atentos a tudo - diz Álvaro Miranda, diretor da base do Vasco.
O processo de subida desses jogadores nos profissionais realmente começou em 2016, com vários deles, como Evander, Mateus Vital e Andrey já treinando nos profissionais. E Mateus Vital começou o ano como titular na equipe então comandada pelo técnico Jorginho. As coisas, no entanto, não caminharam bem, e eles não se firmaram de primeira, o que é absolutamente normal. Alguns passaram muito tempo sem jogar. Mas o Vasco tem um contexto peculiar: a busca por jogadores é feita quase 100% dentro do Rio de Janeiro (nos juniores o zagueiro Ulisses é o único titular não carioca) e nas categorias menores.
- Quando buscamos jogadores no sub-9, sub-8, percebemos que eles criam uma identificação, um vínculo com o clube. E isso ajuda muito em tudo. - analisa Álvaro.
Histórias que não dão certo são frequentes nesse caso. Em 2017, o São Paulo fez isso contra o próprio Vasco na Copa do Brasil Sub-20. Desceu Shaylon, Lucas Fernandes, Éder Militão, todos já com jogos nos profissionais e o respaldo de Rogério Ceni, então treinador, para o duelo entre as duas equipes válido pela segunda fase do torneio. O Vasco sofreu com a pressão, mas venceu por 2 a 0 dentro do Morumbi.
Em 2015, o Atlético-PR, após perder por 2 a 0 o primeiro jogo da final da Copa do Brasil Sub-20 para o São Paulo, adotou o mesmo expediente. Desceu inclusive Marcos Guilherme, com mais de 50 jogos pelos profissionais e já estabelecido. Não conseguiu o título.
No próprio Vasco, o processo não foi simples. Evander, o mesmo meia que encerrou a série de cobranças contra o Flamengo nesta quarta-feira, desceu dos profissionais para os juniores em 2016 para jogar um clássico diante do Botafogo. Foi expulso após tomar dois cartões no mesmo lance por reclamação.
As reclamações de técnicos da base em relação a jogadores que descem dos profissionais são recorrentes, e os motivos são vários. Alguns, por apenas completarem treinos e passarem a maior parte do tempo conversando e carregando material, perdem completamente o ritmo. Outros fazem biquinho e já acham que são craques, portanto a base é um "estágio menor", e não uma etapa a mais na formação. Outros, por característica, atrapalham o processo e o modelo de jogo do treinador, que precisa sempre se adaptar aos jogadores que recebe da melhor maneira possível, além de administrar temperamentos de atletas com os quais, em muitos casos, não convive.
Nesse sentido, mais uma pessoa chave faz parte da conquista do Vasco: o técnico Marcus Alexandre, que conhecia não só os jogadores do sub-17 como também os do sub-20. Ele adotou um esquema humilde nesse início no Vasco: linhas recuadas no 4-2-3-1, marcação individual (com um zagueiro na sobra) e luta pela segunda bola, com muito chutão de trás e pouco jogo com o goleiro.
É possível, de uma maneira propositiva, abrir espaços para críticas a esse modelo de jogo: dizer que não potencializa o entendimento completo dos atletas em algumas situações, como na marcação por zona ou não estimula a saída de bola dos zagueiros, que são capazes de fazer isso (especialmente o camisa 4 Ricardo). Críticas que buscam melhorar o processo são, ou em tese deveriam ser, sempre bem vindas. A eficiência desse sistema, dentro do contexto, já é mais difícil de ser questionada, assim como a capacidade de Marcus Alexandre como gestor, extremamente elogiada pelos jogadores, que o descrevem como um cara extremamente sincero, que fala o que precisa falar, briga, mas não guarda rancor e nem cria birra com ninguém.
Em suma: tudo isso foi dito para indicar que futebol não é receita de bolo, ainda mais na base, em que há diversos vetores agindo sobre o desempenho de um time. E a missão desse time do Vasco foi cumprida: entregar bons jogadores para os profissionais, ao menos nessa geração.
Fonte: Blog na Base da Bola - GloboEsporte.com