Veja relatos de torcedores sobre o tumulto em São Januário
Domingo, 09/07/2017 - 19:43
Havia de tudo em São Januário na noite de sábado. Orgulhosos pais com seus filhos, jovens, irmãos, casais. A maior parte deles, porém, não imaginava o que testemunharia: em vez de festa, cenas de terror, com brigas na arquibancada, confrontos com a polícia e dificuldade para voltar para casa.

Confira os relatos:

O pai tapou os ouvidos do filho por causa das bombas

“Eu cheguei por volta de 17h30. Havia muito roubo de celular na fila. Havia um menininho com necessidades especiais e seu pai perto de mim. O menino era o mais animado ali. O jogo começou, e começaram as sucessões de coisas que levaram àquele final. Brigas dentro da torcida... No apito final começou a tragédia, correria para todos os lados, eu, o menininho, pai dele e mais um grupo de pessoas preferimos ficar parados, não entrar em desespero e correr. A confusão veio para o nosso lado. Foi quando me separei deles, eles foram em direção às cabines de TV e rádio, eu pulei para uns dos camarotes, fiquei preso lá até 21:30... Seguranças e funcionários não estavam deixando sair. Para sair, eu fui para o setor VIP e depois para a social, só consegui sair por lá. Peguei um táxi para casa.

- Sanderson, estudante de 21 anos

A irmã levou o irmão adolescente ao jogo

"Assim que acabou o jogo, os torcedores começaram a tacar as coisas no campo. Vi que ia dar merda, porque estavam jogando bomba. Saí com meu irmão, um amigo e uma amiga. Estava com mais umas 10, 15 pessoas. Fui lá para fora porque estava com coisas na bolsa de alguns amigos. Fiquei esperando eles saírem, porque acreditava que a merda ia ficar lá dentro e passar. Começou a ter confusão lá fora, dos torcedores indo para cima dos policiais. Corri, fiquei perto de um bar um tempo. Teve confusão ali também. Vi que tinha que ir embora.

Quando voltei para perto da entrada 5, do outro lado da rua, estava tendo muita confusão. Os caras estavam jogando para dentro da entrada, em cima dos policias, tudo que viam pela frente. Os policiais estavam dando tiro de borracha, e estava chegando onde eu estava. Me escondi com meu irmão atrás do carro e fiquei pensando o que podia fazer. Essas pessoas perto do muro estavam jogando e se escondendo, outros esperando para ver o que fazer. Veio polícia em cima do cavalo para bater.

Saí dali e fui para outra rua. Saí correndo com meu irmão, atravessei o viaduto, tentei pegar o Uber, mas o cara cancelou muito e cancelou. Fui parar na passarela 5, pedi outro Uber, o cara cancelou também. Não sei se estavam sabendo de alguma coisa. Peguei um ônibus e fui para casa."

- Marina, estudante de 24 anos

O casal ia de arquibancada, mas mudou de ideia

"Eu sempre vou na arquibancada, mas neste jogo minha esposa preferiu ir na social. Durante o jogo já tinham jogado copos. Vi pessoas jogando bombas, sinalizadores. Depois a polícia começou a revidar. Soltou bomba de gás, até na social dava para sentir. Jogadores do Flamengo sentiram também. Uns amigos vendo de casa ligaram para minha esposa e falaram que estava difícil lá fora. Só saí da social às 20h45, consegui pegar um táxi e fui embora sem maiores problemas. Vimos cenas bizarras. Pessoas jogando bomba no campo, policiais jogando bomba na arquibancada. Policiais jogando bomba onde pessoas estavam acuadas.

- Thiago, jornalista de 29 anos

O torcedor que levou um tiro de borracha

"Quando acabou o jogo, eu estava na arquibancada. Desci uns dois, três degraus. Estava olhando para baixo. Quando levantei a cabeça, só vi uma parada acesa vindo na minha direção. Só deu tempo de virar para não bater na minha cara. A bomba já caiu explodindo, e só lembrei de correr para cima, porque eles (policiais) estavam jogando muita bomba na nossa direção. Se eu fico lá, ia pegar mais umas duas em cima de mim.

Fiquei muito tempo lá dentro. Quando saí, a porrada estava comendo na torcida do Flamengo, porque a torcida do Vasco foi para lá. Eu saí nessa hora, pelo portão 5. Já estava vazio. Se eu saísse pelo portão 9 talvez tomasse um tiro também."

- Luiz Felipe, estudante de 19 anos

“Torcedor babaca e polícia despreparada”

"Antes de o jogo acabar, tinha uma rapaziada jogando várias paradas no campo, mas a princípio era copo, essas coisas. Pessoal se empolgou e começou a querer invadir, quebrar tudo. A polícia perdeu a linha também. Jogaram bomba de efeito moral na torcida. Não era todo mundo que estava fazendo várzea. Foi um corre-corre, spray de pimenta. Torcedor babaca e polícia despreparada. O resumo da ópera foi esse."

- Torcedor não quis se identificar, economista de 23 anos

“Nunca tinha visto isso em São Januário”

"Nunca tinha visto isso em São Januário, e lá se vão 20 anos de arquibancada. Eu não estava no foco principal. Estava mais perto do setor VIP, mas mesmo ali a polícia subiu descendo a porrada, por algum motivo. Logo depois do jogo. Sinceramente, acho que foi uma revolta pelo resultado, com uma galera completamente bandida no comando. Não foi algo que eu consiga explicar.

Já vi o Vasco cair em São Januário e não foi nem 1/12 avos disso. Não sei o quanto é programado, o quanto é "podemos tudo" e o quanto é "revolta natural para boçal". Muita bomba para dentro do campo. Muita bomba da polícia para dentro da arquibancada. E aquele corre-corre, atira-atira. Eu ia ficar do lado de fora do estádio, mas ainda estouravam muitas bombas lá dentro, e o gás vinha para fora. Não tinha como ficar."

- Torcedor não quis se identificar; produtor audiovisual de 28 anos



Fonte: GloboEsporte.com


Mais depoimentos de vascaínos

(Recolhidos pelo jornalista David Nascimento, do jornal Lance!)

Gabriel Cirone, de 15 anos - "Eu e meu pai saímos um pouquinhos antes de terminar o jogo e estávamos em um churrasquinho em frente a área da social. Estava tranquilo, mas depois chegou um monte de gente correndo, com a polícia jogando spray de pimenta na gente. Aí, do nada uma amigo do meu pai levou um golpe de cassetete na perna dele, mas ele nem tinha feito nada, estava quieto. Depois de meia hora de já ter terminado a confusão, a polícia veio e eu vi duas bombas de gás caindo perto da gente. Por causa disso eu comecei a vomitar, assim como todo mundo que estava perto da gente. Todo mundo saiu correndo, perdi meu pai e demorei uns cinco minutos para acha-lo. Fiquei tonto durante uma hora, bem desesperador. Nunca passei um momento tão tenso na minha vida."

Nicolas Guimarães, de 25 anos - "Estou acostumado a ir em São Januário e confusão lá não é novidade para mim. Esse ano está tendo muita confusão, a de sábado foi apenas maior. Mas isso muito por culpa da atmosfera criada e também por conta conta polícia, que é muito despreparada. A única coisa que atingiu a mim e meus amigos foi o spray de pimenta que a polícia jogou, assim como as bombas de gás. Claro que a torcida tem culpa, tem bandido no meio da torcida do Vasco, como em todas as torcidas organizadas de outros clubes, mas a polícia contribuiu para a confusão. Eu tentei me manter o mais calmo possível. Eu sou de Três Rio e fui com um ônibus daqui. Muita gente do nosso ônibus pulou para o camarote. Eu fiquei quieto num canto e quando deu uma acalmada eu consegui descer."

Julia Correia, de 19 anos - "Desde o início do jogos os ânimos estavam bem exaltados, acontecendo várias brigas entre as torcidas organizadas mesmo. Eu lembro de ouvir algumas pessoas falando 'vamos invadir o campo, vamos invadir', mas ninguém estava conseguindo, porque mais cedo um rapaz tentou e saiu de campo desacordado. Ninguém se arriscou a pular, ficava em cima do muro, mas não pulava. Como esse pessoal que estava tentando invadir não conseguiu, começou a tacar as coisas dentro do campo. Jogaram latas, garrafas e bombas também. Não sei como eles conseguiram entrar com aquelas bombas, porque o certo é ter uma revista antes. Quando a GEPE começou a revidar, foi nesse momento que a confusão aumentou de uma forma geral. Aí começou a violência, todo mundo começou a correr para quebrar as coisas. Muitas bombas e o gás deixavam as pessoas agoniadas. Algumas pessoas caiam e tinha que socorrer. Eu ouvi relatos de amigos que viram torcedores brigando entre si, um rapaz dando um soco em uma menina. Quando começaram a tacar as bombas, caiu uma do meu lado. Eu tentei a chegar até a saída, mas estava muito cheio. Então eu fui descendo como dava as arquibancadas devagar até chegar no corredor. Lá estava bem cheio também, porque era muita gente tentando sair ao mesmo tempo. Eu fui andando, saindo devagar com medo de tacarem alguma coisa, porque parecia que a polícia não estava vendo para onde estavam tacando. Onde os torcedores agrupavam eles tacavam a bomba, não queria saber se era inocente ou criança. Quando eu cheguei lá fora, tinha muita confusão, muita gente correndo na praça. Eu tentei entrar na Barreira do Vasco para encontrar uns amigos, só que lá também tinha confusão. Tinha gente armada e discutindo. Foi meio que um clima de guerra."

Torcedora pediu para não ser identificada - "Confusão começou desde o início. Muita gente que estava lá dentro,a gente já tinha visto em outros jogos, e eles estavam roubando as pessoas na fila. Na hora que eu entrei, já tinha briga desde o início, é que no final do jogo acabou estourando mais. No intervalo teve briga, uma senhora quase caiu no vão da escada. A gente via que a intenção de certas pessoas era só brigar. Tinha gente ali que não estava nem prestando atenção no jogo. Eu tive até que trocar de lugar no estádio, porque tinha briga em toda parte. E mesmo assim no final do jogo quando tentei me esconder acabei levando spray de pimenta. Tive que sair correndo e nessa hora levei mais spray. Para sair foi um absurdo, porque a gente quase não conseguia sair de São Januário. Quando a gente conseguiu sair, levou mais spray de pimenta e a gente ainda teve que ouvir desaforo de PM que estava lá. Isso sem a gente ter feito nada. Tinha muita confusão do lado de fora. Isso só parou depois que a cavalaria passou"