Mané Garrincha, Alegria do Povo





     Bom, atendendo a uma serie de pedidos que eu recebi de gente

da rede, vou tentar compilar um puco da historia do Garrincha,

segundo o que foi publicado pela revista PLACAR de 92. So espero

que esta mensagem chegue em algum lugar, pois eu tenho tido muitos

problemas com a rede ultimamente...

     A revista tenta, como e proprio de todo trabalho jornalistico,

descaracterizar ao maximo, todos os mitos e lendas que cercam a

carreira do craque e se ater a fatos reais, mas ainda assim, acaba

fornecendo informacoes sobre passagens tao pitorescas, que parece

dificil determinar se aquilo realmente aconteceu, ou se trata-se da

tradicao popular fazendo sua propria historia. Mas, como ja disse

Alexandre Herculano, a historia e verdadeira, mas a tradicao e

verossimil.

     Mane Garrincha nasceu em um minusculo vilarejo do interior do

Rio de Janeiro chamado Pau Grande, proximo a cidade de Petropolis.

Pertencia a uma familia pauperrima de 15 irmaos, e recebeu o nome

de Manoel dos Santos. O apelido Garrincha, foi recebido de um tipo

de passaro, comum na regiao serrana, que Mane gostava de cacar com

seu bodoque.

     A principal atividade economica da cidade, era uma fabrica de

tecidos (America Fabril, se nao me engano) que era de propriedade

de um grupo ingles. Como todos os ingleses, aqueles tambem eram

fanaticos por futebol, e por isso a fabrica tinha um time de

futebol amador, o Pau Grande Esporte Clube. Aos 15 anos, Mane, como

todo garoto da regiao, comecou a trabalhar na fabrica, e nao tardou

a comecar a treinar no time. Logo de cara, todos ja perceberam que

tinham um craque nas maos, mas devido a sua pouca idade, Mane nao

teve chance de jogar pelo time logo de cara, ja que o tecnico

Carlos Pinto temia expor o garoto aos fortes zagueiros dos times

adversarios durante os jogos da liga amadora da regiao. Cansado de

nao ter uma chance de jogar, Mane registrou-se por um  outro time

amador, o Serrano, da vizinha cidade de Petropolis e jogou por

eles, durante quase um ano. Portanto, o primeiro clube oficial de

Mane, nao foi o Pau Grande, como muitos pensam...

     Depois disso, o tecnico Carlos Pinto se rendeu as evidencias

de que tinha nas maos uma das maiores revelacoes do futebol amador

da regiao, e decidiu, apos consultar o elenco do Pau Grande, dar

uma chance ao Mane. Ocorre, que ele era um daqueles tecnicos tipo

Parreira, que se amarram em um joguinho retrancado. Mane, naquela

epoca, jogava na meia direita, posicao ocupada no Pau Grande, por

um jogador daqueles tipo Dunga, que era intocavel na opiniao do

tecnico, para manter uma defesa solida em seu esquema. Carlos Pinto

teria, entao, dito para o Mane: "Se quiser, vai ter que jogar na

ponta". Estava tomada, entao, por puro acaso, ujma das decisoes

mais acertadas de toda a historia do futebol.

     Com a entrada de Mane na ponta direita, o time do Pau Grande,

que ja era respeitadissimo na regiao, passou a ser absolutamente

invencivel, uma verdadeira lenda. Mane comandava o time, e os

placares eram sempre dilatadissimos, tipo 7 X 0, 10 X 2 e coisas do

tipo.

     Claro que depois de algum tempo, muita gente comecou a encher

a cabeca do Mane, dizendo que ele devia tentar a sorte em algum

clube grande da capital. E ele foi. No Flamengo e no Fluminense, os

caras olharam para aquele sujeito de pernas tortas, e nao quiseram

nem saber. Passou uma tarde inteira nas laranjeiras, e uma tarde

inteira na Gavea, e ninguem lhe deu atencao. No Vasco, quase chegou

a treinar, mas na ultima hora algum antepassado do Eurico Miranda

o impediu de fazer o teste, alegando que ele nao havia trazido

chuteiras.

     Depois dessas duas frustracoes, Mane voltou a Pau Grande,

desiludido, e disposto a nao mais tentar nada no que dizia respeito

a futebol profissional. Ate que um dia, apareceu em um dos jogos do

Pau Grande, um desconhecido que se identificou apenas como seu

Orlando, e socio proprietario do Botafogo. O tal seu Orlando,

insistiu de todas as formas para que Mane fosse fazer um teste no

time da Estrela Solitaria, chegou ate a oferecer ao craque o

dinheiro para a passagem. Mane dizia o tempo todo que nao queria

saber mais dessa historia de fazer testes nos times da capital, mas

o sujeito nao desistiu, ate que o tecnico Carlos Pinto pegou o

dinheiro e tranquilizou o homem: "Pode ficar tranquilo, ele vai

estar la". Aqui, vai o fato mais curioso: a reportagem da Placar

nao da detalhes, mas me lembro de ter ouivido em um programa de TV,

que o tal seu Orlando nao apareceu em General Severiano no dia

combinado, e sua identidade permanece ate hoje, um dos maiores

misterios da historia do futebol brasileiro. Eu acho que se existiu

algum dia, um anjo da guarda para o futebol brasileiro, e para o

Botafogo em particular, foi esse cara.

     Seja como for, Mane apareceu em General Severiano no dia do

teste, acompanhado pelo tecnico Carlos Pinto, e pelo presidente do

Pau Grande, Roberto Leite. Este ultimo, preocupado com a total

falta de preocupacao do craque diante dessa que podia ser a maior

chance de sua vida, tentou chama-lo a realidade: "Voce sabe quem

vai te marcar hoje, Mane ? E o Nilton Santos".  "Nao tem

importancia, nao", respondeu o jogador, "em Pau Grande o Joao

tambem me marca". A referencia de Mane ao zagueiro central do time

do Pau Grande (Joao Berruga), acabou servindo como identificacao

para todos aqueles que tentaram neutraliza-lo pelos campos do mundo

afora. Nilton Santos foi apenas o primeiro a sentir na pele, a dura

vida de um Joao. Pode se dizer que Garrincha foi um jogador

democratico: seus dribles nao reconheciam craques ou pernas de pau.

Quando a bola estava em seus pes, todos eram iguais, e atendiam

pelo nome de Joao.

     Quando viu Mane pela primeira vez, com aquelas pernas tortas,

Nilton Santos mesmo admite que nao levou fe. Dizem as mas linguas,

alias, que ele teria virado para um companheiro e dito: "Olha ai,

quando a mare nao esta boa, ate aleijado vem tentar a sorte". Logo

na primeira bola que recebeu, Mane parou a frente de Nilton Santos.

Balancou o corpo para a esquerda, e meteu-lhe a bola no meio das

pernas, enquanto disparava em direcao a linha de fundo. Isso foi

apenas o comeco. Durante todo o treino, Nilton Santos nao viu a cor

da bola. Tomou mais bola entre as pernas, dribles pelo meio, por

fora, drible da vaca, e saiu de campo sem entender o que estava

acontecendo.

     No fim do treino, ninguem mais tinha duvidas de que Mane tinha

de ser contratado, e rapido. So que o tecnico do Bota, Gentil

Cardoso, nao estava em General Severiano naquela manha, e nao era

esperado naquele dia. O treino tinha ficado sob a responsabilidade

de seu filho Newton, medico do clube, que estava receoso de assumir

a contratacao do jogador sem o aval do pai. So que mais uma vez, a

estrela do Botafogo voltou a brilhar, pois quando todos os

jogadores ja estavam no vestiario se trocando, Gentil Cardoso

apareceu por la. Newton imediatamente, virou para o pai e falou,

apontando para o Mane: "tem um garoto ai que e craque". "Quem ?"

perguntou Gentil, "Aquele aleijado ? Nao acredito". Quando acabou

de falar isso, Nilton Santos apareceu e falou: "Gentil, ta vendo

aquele garoto ? Contrata logo, pelo amor de Deus, senao eu nunca

mais vou poder dormir sossegado. Ainda cetico, Gentil Cardoso tirou

todo mundo do chuveiro, e mandou que voltassem para o campo, so

para ver o Mane jogar. Depois de mais uns vinte minutos de

desespero para Nilton Santos e para o resto da defesa do Bota,

Gentil se convenceu e deu o aval para a contratacao do Homem.

     A lenda comecava ai...




Documento em construção. Versão atualizada em 7/12/94
Compilado por:

Luiz Nunes
Email: lnunes@gems.vcu.edu